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Parque del Lago


“Todo es puerta todo es puente
Ahora marchamos en la otra orilla
Mira abajo correr el río de los siglos
El río de los signos
Mira correr el rio de los astros
Se abrazan y separan vuelven a juntarse
Hablan entre ellos un lenguaje de incendios
Sus luchas sus amores
Son la creación y la destrucción de los mundos”
(Octavio Paz)

O projeto para o Parque do Lago nasce de uma linha urbana existente. A linha do Vale de Quito, a linha do aeroporto, a linha da história e da cidade. Uma busca por transformar uma fronteira em oportunidade de união, e mais: uma linha viva que nos oferece uma nova espacialidade e se irradia pela cidade. A oportunidade de conquistar novamente uma condição de unidade e conhecimento para a população de Quito. Sua a água volta à superfície numa aliança entre origem e modernidade, fazendo com que o antigo lago tectônico - que no passado fez surgir à cidade - volte a formar parte da vida de seus cidadãos e que dela se apropriem como se sempre, ainda que por muito tempo abaixo da terra, houvesse estado ali. A intervenção propõe redesenhar essa nova existência de maneira simples, utilizando recursos tecnológicos autossuficientes e buscando a essência do lugar: um presente sem limites. Uma linha que se torna lago.

 1 | A Estratégia De Ocupação Do Território

A apropriação do lugar se desenvolve naturalmente de maneira linear. A partir da pista principal do atual Aeroporto Mariscal Sucre se desenha um eixo principal de ocupação onde se estabelecem seis pontos principais de apropriação. Considerando a enorme extensão do território, sua importância no contexto urbano e a particularidade das áreas vizinhas situadas ao seu redor, estes pontos de ocupação definem regiões de influência capazes de trazer usos e sentido ao longo de todo o novo parque, e evitar que numa área tão ampla sejam gerados espaços subutilizados ou sem o devido aproveitamento de sua potencialidade espacial e social.

O desenho do Lago, principal elemento do parque, surge como uma ação diretamente relacionada com a linearidade da ocupação, onde sua forma responde às necessidades específicas do contexto urbano criando simultaneamente o que é o lago, presente em toda a extensão, e os demais espaços de ocupação. O movimento de suas linhas e dos espaços gerados por elas buscam potencializar os dois lados do eixo, dinamizando a conexão entre ambos e dissipando a ruptura Leste / Oeste hoje existente. Assim, as presenças do eixo e do desenho do lago se convertem numa superfície de união entre os dois lados, uma transposição contínua presente em toda sua extensão e que define um espaço urbano unificado, sem limites, para o pedestre e para o automóvel, em suas devidas escalas.

O programa aparece como elemento dorsal da proposta. A maneira como é distribuído faz com que todo o parque possa ser provido de usos, atividades e funções. Uma implementação flexível que se define mais como um sistema de apropriação de seu território do que uma configuração limitada, podendo se adaptar, modificar ou renovar com o tempo e segundo novas necessidades. Para isso, o programa ecoa todos os aspectos do parque: no eixo principal, nas áreas de recreação, atividades e esportes, no lago, além das áreas específicas culturais e institucionais. Sem isto um parque dessas dimensões que se configura como um grande território da cidade não poderia manter-se dinâmico e pleno de sentido.

2 | Corredor Verde

A área do Parque del Lago já tem em si mesma a particularidade de se constituir como um parque linear. Considerando sua extensão de mais de três quilômetros, este parque oferece a oportunidade de conectar grande parte do setor norte da cidade, seja em seu sentido transversal ou longitudinal, algo impossível hoje. Um corredor verte que se inicia no Panecillo e segue pelas Avenidas América, Diez de Agosto e Amazonas, conectando o Centro Histórico da cidade, os parques La Alameda, El Ejido, La Carolina com o novo Parque del Lago. A partir deste, o corredor continua ao norte alcançando a Avenida Diego de Vasquez e conectando-se com a zona do Estádio L.D.U. - de grande pontencial verde - e podendo seguir sua linearidade até o vale do Rio Villorita. Conjuntamente, eixos verdes transversais podem conduzir os parques altos de Quito como o Parque Metropolitano e El Itchimbia ao novo corredor verde.

3 | Conectividade e Acessibilidade

O projeto se configura como uma articulação de acessos e conexões capaz de voltar a integrar os dois lados da área norte de Quito. Assim, pedestres, ciclistas e veículos podem circular e transitar a longitude do parque cada um à sua maneira mais adequada e sua condição e velocidade sem gerar conflito entre os mesmos.

Pedestres - os acessos para pedestres buscam a conectividade da malha urbana considerando o parque como interface de transição e paisagem entre as duas porções da cidade, minimizando as distancias pela localização das mesmas. No Leste são propostos cinco acessos conectando as principais ruas. No Oeste são seis, considerando a presença das estações de transporte público situadas na Avenida de la Prensa. O Norte e o Sul também se abrem à cidade como acessos importantes do eixo principal. É por este eixo que tudo se conecta ao parque e onde todos os acessos, lagos, programas, circulações se encontram. No centro se encontra a praça monumental de contemplação do lago e da paisagem. A partir de cada entrada, caminhos cruzam toda a extensão do parque levando ao eixo principal, a outros caminhos secundários aos programas e também ou simplesmente como transposição de seu território.

Automóveis - As conexões viárias se apresentam como elementos indispensáveis para a reconstituição da malha urbana, seja pelo caráter de desenvolvimento urbano e de conexão ou por seu potencial de movimento e usos dos espaços em que se encontra. Concebida de maneira a se equilibrar com os fluxos de pedestres e ciclistas, os veículos trazem a presença de um usuário momentâneo que pode ficar no parque ou simplesmente contemplá-lo a partir de sua mobilidade específica. O projeto propõe transposições que atendam estes dois aspectos ao configurar um desenho no qual o motorista passa mais por um caminho do que por uma via, distinto da malha rígida, e que fica ainda mais claro com a mudança de suas pavimentações. O parque conecta as ruas em três pontos: ao norte, ao centro e ao sul. Nos fins de semana ou dias especiais as ruas internas podem ser fechadas.

Ciclovia - A rede de ciclovias urbanas de Quito chega ao novo Parque del Lago pela Avenida Amazonas e se estende por todo seu território, podendo também ser acessada pelas avenidas La Prensa e Ramón Borja, integrando-se ao Corredor Verde proposto.

Transporte interno - Considerando os três quilômetros do parque o projeto propõe a implantação de um sistema de transporte interno no eixo principal por um veículo leve movido por tecnologias de energia sustentável e com paradas localizadas aproximadamente a cada 500 metros. Torna-se essencial oferecer ao usuário a possibilidade de percorrer e conhecer todo o parque num curto período de tempo, além de tornar acessível a qualquer um a totalidade de seus espaços.

4 | Desenvolvimento Urbano e Centralidade

O desenvolvimento de um Plano Especial para o entorno do Parque del Lago é essencial para sua condição futura de nova centralidade na cidade em função do impacto de sua implementação. Recomenda-se o desenvolvimento de um plano para a área do entorno com as seguintes diretrizes:

- Restringir a verticalização ao norte e ao sul do parque a fim de preservar os pontos de vista e as perspectivas da paisagem, além da adequada ventilação da área;
- Promover a densidade e a verticalização controladas mediante o estabelecimento da máxima altura de 20 andares e 60m;
- Estabelecer um mínimo valor para o uso do solo dos novos edifícios, onde a área construída não deve ser menos que uma vez a superfície do terreno e a ocupação até 60% da mesma e deixando ao menos 30% de solo permeável;
- Permitir uma área construída de até 6 vezes a superfície do terreno para os edifícios de escritórios e 4 vezes para os edifícios de habitação, com o objetivo de potencializar parte da valorização imobiliária proporcionada pelas obras do Parque e pela nova infraestrutura, através da contribuição financeira que se calculará a valores do mercado;
- Incentivar áreas de acesso público nos térreos e nos primeiros andares dos edifícios comerciais com ocupações de uso culturais (teatros, escolas, cinemas), de modo que estas áreas não sejam consideradas no cálculo de ocupação máxima;
- Promover a construção de habitações verticais subsidiadas para as classes populares sem a obrigatoriedade de outorgas onerosas;

5 | Programa e Sistema De Ocupação

Mais que uma definição de usos, o programa do parque oferece um particular sistema de apropriação da grande superfície que ocupa o novo Parque do Lago. A proposta apresenta uma possibilidade de ocupação onde prevalece a presença do lago e de uma nova paisagem que se define por suas áreas verdes, atividades, áreas esportivas, de recreação e contemplação, além de quatro espaços específicos: o Grande Espaço Aberto ao centro, a Concha Acústica ao Norte, o Espaço Aberto ao Sul e o Doca no lago principal. De acordo com essa condição territorial se somam sistemas flexíveis que se definem como estruturas suporte para receber os devidos programas e usos correspondentes. Estas estruturas podem ocupar-se ou modificar-se ao longo do tempo, assim como suas localizações exatas também podem ser redefinidas em ocasiões futuras para a adequação a novos usos. As estruturas são:

Eixo - O eixo principal do parque se divide em duas partes: uma grande circulação e um espaço suporte com praças e usos infra estruturais: central de informações, sanitários, segurança, primeiros socorros, espaço para feiras temporárias, bar/café, paradas do transporte interno. Uma marquise se desenvolve sobre sua extensão variando em alturas, conectando espaços abertos, semicobertos e fechados, para oferecer proteção e possibilitar sua ocupação variada.

Equipamentos - A intervenção propõe três Equipamentos Grandes e cinco Pequenos podendo serem considerados fortes promotores dos usos que se encontram no parque, com atividades de nível nacional e internacional. Podem abrigar Museus, Teatros, Salas de Concerto, Bibliotecas, Auditórios, Pavilhões para Eventos e Exposições, Escolas e outros Usos Institucionais ou Culturais. Sua localização, quantidade e tamanho estão implantados da proposta de maneira que melhor se relacionam com os diversos aspectos do projeto e da ocupação do parque, mas suficientemente flexível para se adequar a outras necessidades.

Comunidades - Para a total integração da população com o novo Parque del Lago, nele estão dispostas 6 estruturas destinadas às comunidades vizinhas: Cotocollao, Ponceano, Concepción, Kennedy, Rumipamba y Jipijapa. Cada uma poderia se apropriar à sua maneira e desenvolver suas atividades próprias. Constituem-se como elementos de muita importância para o significado e preservação da identidade do parque, assim como para a cultura de Quito e todo Equador.

Lago - É o principal elemento do parque e nele se propõe uma interação entre o usuário e a água. A proximidade entre ambos ocorre ao longo de todas as circulações, produzindo sempre um contato intenso com o lago. Nele se dispõe elementos como pontes, descansos, cascata, criando-se atividades como passeios de bote, recreação, pequenas praias e mirantes. A intenção é que o usuário também possa se apropriar do lago.

Especiais - A proposta considera três áreas de importante potencial para equipamentos que agregariam ao parque diversas possibilidades de uso durante todo o dia e incluso ã noite: a implantação de um Hotel ao lado do Centro de Convenções; a ocupação de parte do Porto do lago principal por serviços como Restaurantes, Cafés ou Bares e a presença de um museu de importância internacional no terreno vizinho à Avenida 10 de Agosto, somando ao parque uma área privada e de importante visibilidade para a cidade.

6 | Etapas e Técnicas De Execução

As etapas de execução para a construção do Parque del Lago se concebem segundo a maneira mais eficiente de conectar a malha urbana da cidade e priorizar a implantação dos principais elementos do projeto. A primeira fase consiste na execução, ainda que temporária, das transposições de pedestres e das vias do tecido circundante, para solucionar de início a ruptura urbana existente. A segunda instaura um viveiro para o cultivo de plantas que abastecerão o futuro parque. As fases subsequentes configuram 4 setores de implantação do parque: os setores centrais e posteriormente as extremidades norte e sul. Para a execução de cada um destes sucedem as fases: (1) remodelação da superfície da pista principal do aeroporto para receber as novas funções, (2) escavação das áreas do lago, (3) implantação das turbinas eólicas para obtenção da água a partir do lençol freático, (4) adequação da topografia, (5) plantação da vegetação, (6) execução definitiva das transposições e vias, (7) implantação dos equipamentos, (8) plantação da vegetação nas zonas envoltórias dos edifícios construídos. A atual pista do aeroporto se apresenta como um importante equipamento preparado para uma ocupação estratégica no projeto do parque. A reforma de sua estrutura explora sua potencialidade além de aproveitar sua resistente materialidade disponível. Metade de sua dimensão é mantida em sua totalidade tornando-se um grande eixo de circulação. Na outra metade, duas intervenções são necessárias: a perfuração para as turbinas eólicas e a retirada da camada asfáltica de 40cm para a implantação do espelho d’água presente no eixo entre os equipamentos nele propostos.

7 | Ecossistemas: Elementos Água e Vento

A sequência de 12 turbinas ou geradores eólicos a cada 250m ao longo do eixo da pista desativada consistem em elementos verticais que extraem a água subterrânea disponível no lençol freático até a superfície, possibilitando a criação dos seis lagos - de diferentes tamanhos e profundidades - através da utilização da energia eólica e, portanto, evitando o uso de energias convencionais. A água bombeada à superfície é, posteriormente, devolvida ao lençol freático por meio de uma infiltração controlada na parte inferior dos lagos, coberta com argila semipermeável, similar ao solo já existente. Por mais que os ventos não alcancem grandes velocidades e provenham de diferentes direções, o campo aberto da área do aeroporto oferece condições favoráveis de ventilação para o aproveitamento da energia eólica com a aplicação de turbinas ‘Helix Wind’ de alto rendimento e desempenho, inclusive em condições de ventos leves ou de várias direções. O projeto propõe uma solução técnica que adapta e atualiza um simples sistema utilizado durante séculos: o momento de rotação eólica é conduzido por um Eixo-Carda em direção diagonal, propulsando Parafusos de Arquimedes que trazem a água para cima. Caso o vento seja excessivo, a energia excedente gerada pode converter-se em energia elétrica. Além destas funções, as turbinas ao longo da pista podem ser vistas como esculturas simbólicas e como evocação do aeroporto que ali um dia existiu.

8 | O Lago

O desenho das linhas busca a expressão da aparição natural de um lago, como poços que se estendem pelo território e florescem do solo, definindo um trajeto de água no meio da cidade onde a presença desta se encontra quase oculta. Uma variedade de margens define o grau de integração entre o usuário e a água: mirantes, pequenas praias com areia, pedras ou vegetação para que se possa alcançar a água. Isso se intensifica a partir da variação do nível d’água: na medida em que este diminui novas linhas de integração se revelam, obtendo novos desenhos de lago e, consequentemente, de paisagem, como um elemento vivo e dinâmico. O lago, além de ser o principal elemento de uso, contemplação e simbolismo, se torna também uma maneira de se olhar para o parque que muda espontaneamente.

9 | Paisagismo

O projeto paisagístico tem como objetivo criar uma continuidade das coberturas vegetais existentes, considerando as zonas ecológicas da região, ponto fundamental não só para a adaptação e desenvolvimento das espécies, mas também para o meio ambiento no âmbito da cidade. A implantação de massas mais densas, como áreas de reflorestamento, principalmente nos limites com a malha urbana de forma transitória, dá início ao processo de recomposição da vegetação recuperando a forma típica das matas existentes. No contexto urbano, a intenção de formar um corredor verde e de utilizar árvores frutíferas ao longo de toro o parque favorecem o desenvolvimento da flora e principalmente da fauna. O conceito adotado e a de um desenho dinâmico da vegetação, onde existam diferentes tamanhos, texturas e cores para a contemplação dos visitantes, além da utilização apropriada da vegetação para as diferentes funções do parque. Também são propostas árvores de grande altura para canalizar os ventos em lugares estratégicos e marcação de acessos e equipamentos de destaque. A criação de um viveiro para o cultivo já nas primeiras etapas de implantação possibilitará a produção de espécies para reposição, além de poder atender a outros parques e praças públicas da cidade e possibilitar trabalhos educacionais para as comunidades, estimulando a criação de hortas nas áreas comunitárias do parque. Outros pontos importantes são a criação de uma iluminação eficiente que possibilite o uso noturno, provendo mais segurança não só ao parque, mas também a todo o entorno; a drenagem do solo sendo a maioria da pavimentação realizada com pisos permeáveis.

10 | Significado e Identidade

A cidade se oferece como paisagem para a proposta do Parque do Lago. Um lugar sem limites espaciais ou sociais, da qual toda a comunidade possa desfrutar. Um lugar de identificação e prazer. Um desenho de linguagem simples e dinâmica para que nele o cidadão possa se reconhecer, seja o usuário das comunidades locais ou o passageiro, tornando-se um ponto de forte confluência turística da cidade de Quito. Um lugar onde os quatro elementos se unem e se concedem ao homem: (1) o Grande Cubo D’Água no meio do lago acessível por um caminho único configura um espaço de puro recolhimento e contemplação do elemento; no mesmo eixo Norte-Sul, que remete à histórica Estrada Real Pré-Colombiana, se localiza (2) o Grande Mirante do Vento com uma altura de 60m capaz de observar todo e parque e a cidade, e também com o propósito de demarcar um novo parque nas grandes distâncias urbanas; (3) os espaços de contemplação dos vulcões trazem o símbolo do fogo e (4) o parque, definido como solo, território e lugar, faz com que a terra seja o elemento de mais intensa apropriação por parte o usuário. Uma oportunidade de se criar, a partir da estratégia do desenho, um fato de identificação da população oferecendo uma nova maneira de se olhar para a cidade, um símbolo moderno de Quito e do indivíduo equatoriano.


Concurso Público Internacional de Ideas para el Diseño Del Parque Del Lago

Local: Quito, Equador
Ano: 2008
Área do Terreno: 1.260.000m²
Área do Projeto: 1.260.000m²

Autores:
Daniel Corsi
Dani Hirano
Reinaldo Nishimura
Jörg Spangenberg
Candi Hirano
Danilo Terra
Pedro Tuma

Colaboradores:
André Sauaia, Luiz Guilherme Rivera de Castro (Cons. Urbanismo), Gabriela Ornaghi (Cons. Paisagismo), Juliana Assali, Amanda Nascimento Higuti, Camila Costa, Lidia Neves Martello, Pamela Porto Kaninski, Tatiana Hummel Santos

Exposições:
La Bienalle di Venezia – 12ª. Mostra Internazionale di Architettura. Mostra de projetos na Exposição “50 Anos Após Brasília” Pavilhão do Brasil (2010)


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